sábado, 16 de março de 2024

UAI, UÉ ! DE ONDE QUE O TREM É ? - Possíveis origens históricas de alguns falares mineiros

 


Por: Marcos Paulo de Souza Miranda

 

 

            - Uai, que trem bão é esse ?

            - Ué, é queijo, sô!

 

Um colóquio de conteúdo como o acima transcrito seria  coisa por demais comum nas Minas Gerais, estado notoriamente conhecido pelo falar peculiar de seu povo, a ponto de já existirem no mercado editorial do país alguns Dicionários de Mineirês[1], que revelam o significado de palavras e expressões tais como: arreda, cascar fora, fingir de égua, tem base,  entre muitas outras.

Mas verdadeiro signo identificador do vocabulário mineiro é a palavra “uai”, que, pelo seu uso reiterado, sempre desperta a curiosidade dos forasteiros, e estes,  ao indagarem o significado da expressão aos naturais da terra, não raras vezes recebem como resposta:   “uai é uai, uai !”




Outras palavras que figuram como contumazes companheiras de “uai” são “ué” e “trem”, que formam uma das mais tradicionais tríades cristalizadas no linguajar montanhês.

Mas onde estariam as origens  históricas dessas palavras ? Seriam heranças linguísticas deixadas pelos antigos  povoadores ou criação recente  dos nativos das Minas ?

Vejamos.

Sobre “uai” são várias as especulações a respeito da palavrinha usada para exprimir espanto,  surpresa, admiração, dúvida,  impaciência; como um recurso para retardar a resposta, marcando um tempo para reflexão,  e mesmo para reforçar o que foi dito anteriormente, como se se estranhasse a dúvida do interlocutor, afinal de contas mineiro não é homem de duas palavras, uai !

Uma hipótese já levantada como possível origem da interjeição "uai" é que ela seria uma transposição do inglês "why" (por que) para o português, como consequência do contato dos mineiros com os imigrantes ingleses, no século XIX, tendo começado em Nova Lima, com a ida de trabalhadores para a Mina de Morro Velho, por volta de 1834

Contudo, a presença de ingleses em Minas Gerais se deu em poucas regiões e em tempos mais recentes, quando as Minas Gerais  já eram conhecidas e habitadas há mais de um século, com um vocabulário local bem assentado. Ademais, nem sempre faz sentido trocar “uai” por “por quê”, constatação que enfraquece a tese do empréstimo lexical oriundo da língua de Shakespeare.

Em razão da existência de uma serra com a denominação de “Uaimi-i” na região de Ouro Preto, chegamos a aventar a possibilidade da origem indígena da expressão "uai", hipótese que descartamos logo ao constatarmos que se tratava de uma mutação da expressão Guaicuy ( ou Gwaimi-y, que, não por acaso, passa no sopé da serra a que nos referimos.

Recentemente aprofundamos nossas pesquisas nos antigos falares do Reino de Portugal, onde encontramos pistas que parecem nos ajudar a compreender a origem da tradicional tríade à qual nos referimos acima.

No Dicionário de Falares dos Açores[4], para nossa surpresa, logramos encontrar  o verbete “uai” que, segundo o autor,  constitui uma interjeição com significado de exclamação de espanto, estando presente, inclusive, na obra denominada Pastorais do Mosteiro, de autoria do Padre Nunes da Rosa, onde se lê: “Uai! Uai! Louvado seja Deus!”.

Já para o “ué”, encontramos o verbete assimilado “uei”, como uma exclamação característica da Ilha das Flores, também usada na Ilha do Corvo,  com o sentido de “Oh!”, podendo exprimir um reforço do que vem a seguir (Uei sim! = claro, certamente), além de indignação (Uei homem !). Segundo o autor, a região do Douro, em Portugal continental, também faz uso da referida interjeição.

Vale destacar que, na primeira metade do século XVIII, do Arquipélago dos Açores (constituído por nove ilhas e, ainda hoje, possessão portuguesa)  vieram  muitos milhares de imigrantes para as Minas Gerais, em razão das fabulosas notícias que lá chegavam sobre o ouro  que aqui abundava. Boa parte dos açorianos acabou se fixando nas regiões do Sul de Minas, Zona da Mata e Campo das Vertentes, constituindo um dos principais troncos genealógicos da antiga Comarca do Rio das Mortes, sediada na Vila de São João del-Rei.

O encontro das expressões “uai” e “uei” no vetusto vocabulário açoriano, de onde proveio grande  parte dos primeiros povoadores de Minas Gerais, nos faz crer que esteja naquele arquipélago as origens dessas palavras hoje cristalizadas no vocabulário do povo mineiro.

Já no que diz respeito à palavra “trem”, segundo o jocoso Dicionário Mineirês, de Paulo Araújo, para os mineiros tal palavra pode significar absolutamente qualquer coisa, incluindo objetos (v.g., Pode trazer aquele trem ali para mim?) ou comida (v.g., Estou com vontade de comer um trem doce hoje).

 

        Fato é que no falar mineiro a palavra  trem é polissêmica e não guarda, necessariamente, correspondência com o trem de ferro, que chegou às Minas somente na segunda metade do século XIX, quando nosso vocabulário já estava bastante sedimentado.

Em nossas pesquisas fomos buscar o seu significado em um dicionário português publicado em Lisboa no ano de 1789[5], onde aparece o verbete “trem” com o significado de “a bagagem que acompanha alguém de jornada”. 

Também descobrimos um documento escrito por volta de 1750 pelo bandeirante Bento Fernandes Furtado em que ele narra a chegada, na região de Ouro Preto,  dos  primeiros aventureiros  em busca do ouro, afirmando que a maior parte deles eram pobres e  vinham sós, "com o seu limitado trem às costas"6, o que demonstra o uso da palavra "trem" nas Minas desde a sua descoberta.

Ou seja,  trem, para os antigos portugueses, compreendia todas as coisas que eram levadas na bagagem dos viajantes (o que, aparentemente,  inclusive explica o uso da expressão  "trenheira" pelos mineiros, com o significado de “montoeira de coisas”).

                              Bandeirante com um trem a tiracolo

Assim, descoberta sua origem, fica explicado etimologicamente que trem significa coisa, ou seja, quase tudo o que existe ou possa existir, de natureza corpórea ou incorpórea, o que justifica a sua larga utilização.

Depreende-se de tais assertivas que, longe de serem expressões caipiras ou incultas cunhadas em tempos recentes, as tradicionais e singulares palavras uai, ué trem possuem suas origens nos antigos falares portugueses, o que demonstra que os mineiros souberam preservar, de forma particular,  a autenticidade das heranças linguísticas recebidas de seus ancestrais e que hoje  podem ser consideradas integrantes do patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais.



[1] MOTA, Carlos. Dicionário Fanadês, Jequitinhonhês e Mineirês.  Stephanie. 2008. ARAÚJO, Pedro. Dicionário de Mineirês. Belo Horizonte: Tumate Cru. 2024. FERNANDES, Elmo. Dicionário Mineirês Descomplicado. 2024.

[2] ALBUQUERQUE, Iara Maria Barbosa Lages. Hipóteses sobre a origem de uma expressão.  In: RAMOS, Jânia M. COELHO, Sueli Maria (Org.). Português brasileiro dialetal: temas gramaticais. Campinas: Mercado de Letras. 2013. p. 11-19.

[3] Em tupi-guarani, “gwaimi” quer dizer “velha” e “i” final significa “rio”.

[4] BARCELOS, J. M. Soares de. Dicionário de Falares dos Açores.  Vocabulário regional de todas as ilhas. Coimbra: Almedina. 2008. p. 567.

[5] Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D. Rafael Bluteau / reformado, e accrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro. - Lisboa: na officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 

[6] MATOSO, Caetano da Costa.  Códice Costa Matoso.  Coleção das notícias dos primeiros descobrimentos das minas na América. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro.  1999. Vol. I, p. 185.


quarta-feira, 3 de novembro de 2021

ANTIGA ROTA DE LIGAÇÃO ENTRE MINAS GERAIS E RIO DE JANEIRO COMPLETA 210 ANOS

 

Livro sobre o Caminho do Comércio será lançado em 14/11/2021 em Bom Jardim de Minas

 

 

UM NOVO CAMINHO REAL - Em 14 de novembro de 1811 a “Real Junta do Commercio, Agricultura, Fabricas e Navegação do Estado do Brazil e seus Domínios Ultramarinos”,  órgão integrante da administração joanina,  determinou a abertura do “Caminho do Comércio”,  com o objetivo de facilitar a ligação de Minas Gerais à cidade do Rio de Janeiro e possibilitar, de forma mais rápida e econômica, o abastecimento da Corte, cuja população havia aumentado consideravelmente com a chegada da Família Real no Brasil, em 1808.



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O  Caminho Novo, aberto no início do século XVIII por Garcia Rodrigues Paes,  era muito longo e não conectava o Rio de Janeiro  diretamente com a principal área de produção de alimentos de Minas Gerais (Sul de Minas e Campo das Vertentes), tornando-se obsoleto e inadequado no início do século XIX, o que também motivou a criação do Caminho do Comércio, que era muito mais curto e econômico, pois os impostos cobrados na divisa entre as Capitanias eram  mais baratos.

ALIMENTOS, FERRAMENTAS E ESCRAVOS - Fazendo uso da rota que foi concluída em 1816, as tropas partiam da Comarca do Rio das Mortes, cuja sede era em São João del-Rei mas abrangia vasta extensão de Minas  Gerais, conduzindo  bois, porcos, toucinho, galinhas e queijos, e retornavam do Rio de Janeiro trazendo produtos como sal, azeite, vinho, vinagre, bacalhau, lampiões, ferramentas e vidros. Os registros históricos demonstram, ainda, que grandes quantidades de escravos eram transportadas do litoral em direção às fazendas mineiras para o abastecimento de mão de obra.




Tropeiros percorriam diariamente o Caminho do Comércio



A cada três léguas de distância, aproximadamente, existiam ranchos rústicos rodeados de estruturas singelas que permitiam o pernoite dos viajantes, que sempre contavam com uma bica de água limpa, estruturas de pedra para fogueiras e árvores tais como a araucária em suas proximidades, cujos galhos secos funcionavam como lenha de fácil combustão, essencial para minorar o frio nas serras e nos grotões da região da Mantiqueira.


ROTA DE COMERCIANTES E CIENTISTAS - A rota tinha início na localidade de Nossa Senhora da Piedade do Iguaçu (atual distrito de Nova Iguaçu-RJ), cortava a Reserva Biológica Federal do Tinguá subia as serras, passava pelo porto de Ubá (atual Andrade Pinto, distrito de Vassouras), seguia  em direção a Valença e depois passava pelos antigos arraiais  mineiros de Rio Preto (região de Varejas e Funil), Bom Jardim (passando por Taboão), Turvo (atual Andrelândia), Madre de Deus, São Miguel do Cajuru, Rio das Mortes Pequeno e, finalmente, chegava à Vila de São João del-Rei, percorrendo cerca de 280 km.



 

Além de comerciantes, as pesquisas indicam que também muitos cientistas estrangeiros percorreram o trajeto durante o século XIX, com o francês Auguste de Saint-Hilaire (1819), os ingleses Robert Walsh (1829)  e Charles James Fox Bunbury (1835) e o alemão Enst Hasenclever (1839), que deixaram registros importantes sobre o caminho.

Muitos vestígios e alguns trechos originais do Caminho do Comércio  ainda existem e estão sendo mapeados por um grupo de pesquisadores que atua na região do Alto Rio Grande, em Minas Gerais.

COMEMORAÇÃO CONTARÁ COM LANÇAMENTO DE LIVRO - No próximo dia 14 de novembro, às 9:00h, no Casarão Recanto do Saber e da Experiência Dr. Celso Nardy Chaves, em Bom Jardim de Minas, será realizada pela Prefeitura Municipal da cidade a cerimônia de comemoração dos 210 anos de criação do Caminho do Comércio. Na ocasião será também lançado o livro “Estudos Históricos sobre o Caminho do Comércio – Edição Comemorativa da Rota”, de autoria dos historiadores  Marcos Paulo de Souza Miranda e Rodrigo Magalhães, que pesquisam o trajeto há mais de dez anos.

Livro sobre o Caminho do Comércio terá "Passaporte do Viajante"

Segundo os autores, o Caminho do Comércio é uma importante rota oficial surgida no período colonial  e ao seu longo existem grandes  atrativos culturais e paisagísticos, além de vários locais para a prática do turismo ecológico e cultural. As ruínas centenárias de Iguaçu Velho, a natureza exuberante da Serra do Tinguá e as fazendas coloniais da região de Valença e Vassouras, no Estado do Rio de Janeiro; as  belas cachoeiras e paisagens serranas da região compreendida entre Rio Preto e Bom Jardim, incluindo a famosa gruta do Funil; a arquitetura colonial, os sítios arqueológicos, os doces, o queijo e a cachaça de qualidade produzidos na região de Andrelândia; as fazendas e igrejas centenárias, as serras e as tradições folclóricas da região de Madre de Deus de Minas; a bela capela de São Miguel do Cajuru, com pinturas artísticas do renomado pintor José Joaquim da Natividade; as ruínas da antiga Capela do Rio das Mortes, onde foi batizada a milagrosa Nhá Chica e a imponente arquitetura tricentenária de São João del-Rei, idealizada pelos inconfidentes mineiros como a capital da sonhada república da liberdade,  são pequenos exemplos do potencial turístico desse caminho, cujo itinerário precisa ser  melhor conhecido e divulgado.

O livro contém ao final o “Passaporte do Caminho do Comércio”, onde os viajantes que percorrerem a rota poderão colecionar os carimbos dos municípios por onde passaram.

Pontos específicos estão sendo criados ao longo da rota para chancelar a passagem dos turistas.

 

Maiores informações sobre  o evento de comemoração e lançamento:

Telefone

Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Bom Jardim de Minas

educacao@bomjardimdeminas.mg.gov.br

sábado, 14 de abril de 2018

PEDRAS E SÍMBOLOS EM MINAS GERAIS




Marcos Paulo de Souza Miranda
Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e do Núcleo de Pesquisas

A pedra é material que se encontra presente em praticamente todas as obras que foram realizadas nos primórdios de Minas Gerais, a exemplo de paredes de templos e edificações, muros, calçamento de vias, chafarizes, alicerces, currais, marcos de divisas etc.
A profissão de pedreiro (na plena acepção da palavra) era difundida e respeitada na Capitania de Minas, além de ser um ofício regulamentado, que somente podia ser exercido por profissionais aprovados e registrados pelas respectivas Câmaras Municipais.
Mas há algo que ainda precisa ser melhor pesquisado em relação às produções dos antigos pedreiros de Minas, pois muitas de suas obras estão assinaladas com marcas e símbolos que, aparentemente, ainda não despertaram a atenção dos historiadores e arqueólogos.
Tem-se conhecimento de que as “marcas de pedreiro” estavam presentes nas antigas edificações da Idade Média, como forma de identificação dos mestres responsáveis por sua execução (firma magister), sendo objeto atualmente de estudos da chamada gliptografia (ciência que estuda as pedras antigas gravadas).
            Para além das marcas dos fabricantes, temos conhecimento ainda sobre a presença em Minas de símbolos existentes em estruturas de pedras que, aparentemente, estavam relacionados a representações religiosas e de poder, o que possivelmente é oriundo das milenares tradições lusitanas que para cá se transportaram.
Quanto aos sinais dos fabricantes, sabemos que remonta às Corporações de Ofício do período medieval as chamadas “marcas dos mestres”, que normalmente eram compostas pelas iniciais do nome do profissional. Era uma forma de se possibilitar a fiscalização do exercício da profissão, algo parecido com a Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) dos dias atuais. Esses sinais estão presentes em incontáveis edificações portuguesas e espanholas, onde são conhecidos como “signos lapidários”.
Em nosso Estado, de igual forma, no calçamento das ruas de Diamantina, nos deparamos com muitos signos de identificação, ao que tudo indica, dos antigos pedreiros responsáveis pela produção das lajes utilizadas na pavimentação do antigo Arraial do Tejuco.


Mas há também signos relacionados, aparentemente, a tradições religiosas cristãs. Na região central, nos deparamos com diversas pedras de mó, antigamente utilizadas em moinhos para produção de fubá, com a presença marcante de uma cruz. Considerando que pela diversidade de pedras que analisamos em locais distintos, certamente os fabricantes eram muitos, aventamos a possibilidade do símbolo ser utilizado com o sentido de invocar alguma proteção espiritual sobre o artefato ou mesmo para abençoar o produto alimentar resultante do seu uso.


Outro tipo de simbologia que identificamos nas pedras está relacionada ao poder do Rei e seus ministros no que tange à concessão de terras, tradição supostamente ligada  à antiga Ordem de Cristo, da qual o Rei de Portugal era Grão Mestre. As antigas sesmarias, concedidas por carta do Governador da Capitania e confirmadas pelo Rei de Portugal, precisavam ser medidas e demarcadas.  No centro da propriedade era fincado um marco de pedra, chamado pião, que era assinalado com quatro cruzes voltadas para os pontos cardeais da propriedade. Nas quatro extremidades da sesmaria, normalmente de meia légua em quadra, eram afixados outros marcos, com a representação de uma cruz, que era voltada para o pião.
Na cidade de Andrelândia, Sul de Minas Gerais, localizamos dois marcos contendo esses sinais. Um deles foi resgatado da área de uma empresa de silvicultura e está exposto em uma das praças da cidade.
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Às margens do Caminho do Ouro, que liga Paraty a Minas, nos deparamos com duas pedras com gravações cruciformes, podendo estar relacionadas à delimitação oficial do antigo Caminho Real.
 

Aventamos, ainda, a possibilidade da presença de sinais relacionados à Ordem Maçônica em estruturas de pedra produzidas no período colonial de Minas Gerais. Na pavimentação de Grão Mogol, antigo arraial diamantífero do Norte de Minas, existem representações que retratam o compasso, o esquadro e o sol, sabidamente relacionados à simbologia e às antigas práticas dos Pedreiros Livres. Em Ouro Preto, há um vetusto chafariz com a representação de três triângulos equiláteros concêntricos, com possível ligação à trindade maçônica em razão de informações históricas relacionadas à propriedade em que se encontra.

Por derradeiro, há símbolos presentes em pedras que, ao que tudo indica, estão relacionados às práticas de cristãos-novos. No município de Rio Acima, Região Central, existe uma verga de uma antiquíssima casa com a presença de elemento cruciforme e inscrição muito semelhantes a símbolos identificados nas antigas judiarias portuguesas e que são atualmente objeto de estudo da arqueologia judaica na Europa.

            Está inscrito nos versículos de Dt. 4-9, 11, 13-21 o “Shemá”, oração fundamental do Povo de Israel que manda gravar nas ombreiras das portas e janelas as suas palavras: “Tú as atarás à tua mão como um sinal, e serão como um frontal entre os teus olhos, tu as escreverás nos umbrais da tua casa e nas tuas portas”.

Enfim, há um campo vasto a ser explorado a fim de se identificar e tentar melhor compreender os significados dos símbolos presentes nas seculares pedras de Minas Gerais.

EFEMÉRIDES DA FÁBRICA DE TECIDOS SANTA BÁRBARA, SITUADA NO MUNICÍPIO DE AUGUSTO DE LIMA, NORTE DE MINAS GERAIS



Marcos Paulo de Souza Miranda

Em meados do século XVIII a Fazenda Santa Bárbara, próxima ao Rio Curumataí, então pertencente ao Arraial do Tejuco, era propriedade do afortunado contratador João Fernandes de Oliveira, amasiado com a lendária Chica da Silva. Contava com uma casa de vivenda térrea, coberta de telha, um engenho de moer cana, movido por bois, uma casa de moinho coberta, bom rego d’água. A fazenda era muito extensa e estava dividida em dois retiros: Cavalgadura e São Miguel, que contavam como currais de pau-a-pique.

1856  - A Fazenda estava arrendada a Bento José Afonso Fernandes. Era então propriedade do Morgado João Germano de Oliveira Grijó, neto de João Fernandes e Chica da Silva.

1872 – O Governo da Província, por meio da Lei nº 1909, determina a análise das águas minerais termais existentes na Fazenda Santa Bárbara.

1884 – O comerciante de diamantes João da Matta Machado (08-02-1818 – 24.04.1886) idealiza a fundação da Fábrica de Tecidos Santa Bárbara, incumbindo seus filhos de darem andamento ao projeto. O local para implantação do empreendimento seria a Fazenda Santa Bárbara, então pertencente ao município de Diamantina e, atualmente, ao município de Augusto de Lima, a 285 km de Belo Horizonte. 

1885 – A planta da fábrica foi elaborada pelo engenheiro Eduardo Bonjean, o mesmo que montou o Palácio de Cristal em Petrópolis em 1884. O maquinário foi importado da Inglaterra, seguindo de trem do Rio de Janeiro até Conselheiro Lafaiete, de onde foi transportado em carros de boi até Sabará. Em seguida as máquinas foram embarcadas em balsas e desceram pelo Rio das Velhas até um porto chamado Manga, situado perto da fábrica.

19 de maio de 1886 -  Fundada em Diamantina  a sociedade comercial Matta Machado, Moreira & Cia, com o objetivo de produzir tecidos de algodão e promover a venda do produto. Foram fundadores: Dr. João da Matta Machado, Antônio Moreira da Costa (Barão de Paraúna), Augusto da Matta Machado, Álvaro da Matta Machado, Pedro da Matta Machado, Francisco Correa Ferreira Rabelo, João Antônio Lopes de Figueiredo, Pedro José Versiani e José da Silva Machado. 

1887 – O Jornal “A Província de Minas”, publicado em Ouro Preto em 06 de outubro de 1887, registra as propriedades medicinais das águas da Fazenda Santa Bárbara.

22 de maio de 1888  foi dado início à produção de tecidos de algodão sob a responsabilidade dos mestres ingleses João Kirch e Thomaz Moore. A água para movimentar o maquinário era captada no córrego da Areia, no alto da Serra do Espinhaço, sendo transportada por canais de pedra e por bicames  fabricados de aroeira e cedro.

1893 – Alice Dayrell registra em seu diário que vários familiares iam tratar-se nas águas quentes de Santa Bárbara. O diário foi publicado posteriormente com o título “Minha Vida de Menina”, sob o pseudônimo de Helena Morley.

1894 – Influenciados pela Encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII, sobre a condição dos operários, os proprietários da fábrica estabeleceram a coparticipação dos empregados nos lucros da empresa e criaram um fundo de beneficência para amparar os doentes e idosos.

1896 – Dirigia a tecelagem o Capitão Augusto da Mata Machado. O gerente era Francisco Diogo de Araújo Tameirão.

1898-1899 – Uma forte seca ocorrida na Bahia implicou em diminuição drástica do algodão que era fornecido para a fábrica de Santa Bárbara, que enfrentou grave crise financeira.

04 de dezembro de 1903, em razão de dívidas com o Banco Hipotecário do Brasil, a fábrica foi penhorada. À época o mestre de fiação era o inglês James Winders.

1906 – A fábrica contava com 1744 fusos, 72 teares, consumia 100 mil quilos anuais de tecido, força motriz de 150 cavalos de energia hidráulica, 120 operários, produzindo  um milhão de metros anuais de tecidos brancos, lisos, entrançados, sob a gerência do Coronel Teófilo Marques Ferreira.

1909 – Construído o prédio que seria utilizado como cinema posteriormente.

23 de fevereiro de 1933 – A fábrica é adquirida Pelo comerciante e banqueiro João Leopoldo Modesto Leal, titulado conde Modesto Leal pela Santa Sé (Araruama1860 — Rio de Janeiro31 de outubro de 1939), juntamente com outros sócios residentes no Rio de Janeiro.

1950 – João Paculdino Ferreira (01-06-1900 – 06-12-1963), filho de antigos operários da tecelagem,  adquire a Companhia Fiação e Tecidos Santa Bárbara e começa a modernizá-la, construindo uma usina para geração de energia elétrica e substituindo o antigo maquinário inglês movido a energia hidráulica. A usina foi inaugurada em 13 de janeiro de 1953.

1955 – João Paculdino Ferreira constrói um novo prédio para a fábrica, defronte ao antigo e imponente casarão industrial inaugurado em 1886. A tecelagem encontra-se ainda em funcionamento.
1962 – Parte do prédio da Fábrica Velha foi destruído por uma descarga atmosférica.

1963 - Com a morte de João Paculdino, a administração da empresa passou para seus filhos João e Alberto e hoje se encontra nas mãos da terceira geração da família.

1999 – Início da construção do hotel Águas de Santa Bárbara.

2014 – Em 24 de fevereiro o Ministério Público do Estado de Minas Gerais recomenda ao Município de Augusto de Lima o tombamento do conjunto arquitetônico da antiga Vila de Santa Bárbara.

2015 – Em 26 de agosto foi firmado pela Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, Município de Augusto de Lima e proprietários da fábrica, acordo para o tombamento consensual do conjunto arquitetônico da Vila de Santa Bárbara. O tombamento foi deliberado pelo Conselho Municipal de Patrimônio Cultural de Augusto de Lima em 04 de dezembro.

2016 – Em 21 de janeiro foi editado o Decreto 03/2016, homologando o tombamento do prédio da Fábrica de Tecidos Santa Bárbara e as edificações do seu entorno. No dia seguinte o bem foi inscrito no livro do tombo, passando a ser o primeiro bem protegido do município.

2016 – Em 27 de abril foi firmado acordo pelo Ministério Público com os proprietários e o Município de Augusto de Lima para elaboração do projeto de restauro dos bens tombados.

UAI, UÉ ! DE ONDE QUE O TREM É ? - Possíveis origens históricas de alguns falares mineiros

  Por: Marcos Paulo de Souza Miranda                 - Uai, que trem bão é esse ?             - Ué, é queijo, sô!   Um colóquio de conteúdo...